Um ensaio em três actos
André Cepeda
Lisboa, 3 Abril de 2021
Em 2015, iniciei o ensaio fotográfico para o livro dedicado à reabilitação do Mercado do Bolhão. O meu trabalho constitui-se em três fases, bastante diferenciadas.
A primeira é o registo do mercado antes do início das obras. Uma fase muito importante, que mostra o mercado como ele se encontrava antes de começar a grande transformação. Centrei-me na escala do lugar, na luz, nas sombras, nos materiais. Comecei por fotografar o exterior e depois a vista geral do interior. Depois de ter fotografado a estrutura, a envolvência, a implantação do edifício na cidade e as ruas em redor, dediquei-me a olhar com mais detalhe para o espaço e a estabelecer uma relação mais estreita com a vivência que encontrei — a forma como o mercado era apropriado pelas pessoas que lá trabalhavam e pelas pessoas que o frequentavam. Nestas imagens, percebem-se as várias camadas do tempo, a arquitectura, o ambiente, assim como a vivência de um lugar tão importante e marcante no comércio do centro da cidade. A cor, a luz, as sombras, as texturas formam um olhar em que se sente um ritmo intenso, com uma sonoridade única, impregnada na pedra e no ferro. Fotografias, tanto do interior como do exterior, onde se reconhece os muitos anos de vida do mítico Mercado do Bolhão.
A segunda etapa, que estou agora a realizar, são as imagens de obra, onde se percebe a destruição e reconstrução do mercado. É uma fase mais fria, húmida, dura, suja, num ambiente diferente, e isso muda completamente a forma como olho para o espaço, que está em profunda mudança. Um olhar focado nos detalhes que caracterizam estas fases de obra.
A terceira fase, será quando o projecto de reabilitação ficará concluído e as pessoas a voltarem a ocupar e viver o novo mercado.
O mais importante, sempre que faço fotografia de arquitectura, é sentirmos a escala do lugar, a arquitectura, o desenho, as linhas, os materiais, e que através da selecção das imagens, do interior e do exterior, se consiga perceber um percurso, uma certa narrativa. Existe sempre uma interpretação pessoal, em que a poesia toma um lugar importante.